Novo medicamento é aprovado nos EUA e pode ajudar a prevenir enxaquecas

 

São Paulo, 18 de maio de 2018.

O primeiro medicamento destinado a prevenir a enxaqueca foi aprovado pela FDA (Food and Drug Administration, agência regulatória americana) na quinta-feira (17/5), o que poderá dar início a uma nova era no tratamento de pessoas que têm a forma mais grave dessas dores de cabeça.

A droga, Aimovig, fabricada pela Amgen e pela Novartis, é aplicada em uma injeção mensal com um dispositivo semelhante a uma caneta de insulina. O preço aprovado é de US$ 6.900 por ano (cerca de R$ 25,5 mil). Segundo a Amgem, o medicamento estará disponível para os pacientes dentro de uma semana. Não há ainda previsão de aprovação no Brasil.

A droga bloqueia um fragmento de proteína, CGRP, que provoca e perpetua enxaquecas. Três outras empresas —Lilly, Teva e Alder— têm medicamentos semelhantes nos estágios finais de estudo ou aguardam aprovação da FDA.

"Essas drogas terão um impacto enorme", diz Amaal Starling, neurologista e especialista em enxaqueca da Mayo Clinic, em Phoenix, no Arizona. "Este é realmente um momento incrível para meus pacientes e para neurologistas que tratam pacientes com enxaqueca."

Uma em cada sete pessoas em todo o mundo sofre com enxaquecas. Dentre elas, 37 milhões de americanos —até 20% das mulheres e 10% dos homens. Cerca de 2% da população mundial lida com enxaquecas crônicas. Segundo algumas estimativas, a enxaqueca é a terceira doença mais comum no mundo e está entre as dez principais causas de incapacidade.

A nova droga não impede todos os ataques de enxaqueca, mas pode torná-las menos severas e reduzir sua frequência em 50% ou mais. Como um editorial recente da revista médica Jama disse, "trata-se de um progresso, mas não uma panaceia".

Até agora, as drogas usadas para prevenir a enxaqueca foram projetadas inicialmente para tratar outras doenças, como a hipertensão arterial. No entanto, elas não são muito eficazes, podem funcionar apenas temporariamente, e muitas vezes têm efeitos colaterais intensos.

Nos ensaios clínicos, as pessoas que tomaram as novas drogas não relataram mais efeitos colaterais do que as que tomaram placebo. Os efeitos colaterais no longo prazo e entre pessoas com doenças crônicas, porém, ainda precisam ser determinados.

"Por enquanto, as drogas parecem fantásticas e podem mudar a forma como tratamos enxaquecas", diz Stewart J. Tepper, médico e professor de neurologia do Dartmouth College sobre as novas drogas.

A enxaqueca não é apenas uma dor de cabeça; ela geralmente é acompanhada de sintomas incapacitantes, como náusea e vômito, dificuldade para falar e aversão à luz e ao ruído. A dor de cabeça pode ser latejante e durar horas ou dias. Pacientes muitas vezes tentam os tratamentos disponíveis um após o outro, em combinações variadas. Efeitos colaterais são frequentes e incluem confusão mental, sedação, ganho de peso, disfunção sexual e boca seca, levando a cáries.

Alguns pacientes, inclusive, acham os efeitos colaterais piores do que as enxaquecas. Oitenta e cinco por cento dos pacientes com enxaqueca param de tomar os medicamentos dentro de um ano.

Em um estudo que revisou os tratamentos para enxaqueca, o Instituto de Análises Clínicas e Econômicas (Icer, na sigla em inglês) entrevistou pacientes com enxaquecas frequentes. Muitos disseram que deixavam de fazer planos ou marcar compromissos porque nunca sabiam quando teriam uma enxaqueca.

Segundo o relatório, eles estavam frustrados, deprimidos, derrotados, isolados ou achavam que eram um fardo para a sociedade. Também se queixaram de serem estigmatizados e que suas enxaquecas não eram levadas a sério. Muitas vezes, tentaram uma longa lista de tratamentos, com pouco ou nenhum sucesso.

Até mesmo crianças pequenas têm enxaquecas, diz o Andrew D. Hershey, diretor de neurologia e diretor do centro de dor de cabeça do Centro Médico do Hospital Infantil de Cincinnati. Ele está envolvido em um estudo clínico que testa uma das novas drogas em adolescentes de 12 a 17 anos e planeja eventualmente estudar a droga em crianças com apenas 6 anos de idade.

Mas os anticorpos monoclonais, como os novos medicamentos, são cultivados em células vivas e caros para se produzir. Por causa do alto preço do medicamento da Amgen, não se sabe se seguradoras vão arcar com os custos e se os pacientes que pagam altos valores de coparticipação também vão dar conta.

Numa análise preliminar de custo-efetividade, o Icer concluiu que se o medicamento Amgen custar US$ 8.500 por ano (cerca de R$ 31,4 mil), o preço seria razoável para a melhora da qualidade de vida de pacientes que têm pelo menos 15 vezes por mês.

O grupo publicará uma análise final em duas semanas, incorporando as contribuições do público e o preço real do medicamento da Amgen.

A ideia por trás das novas drogas remonta à década de 1980, quando os pesquisadores notaram que o fragmento de proteína CGRP parecia desempenhar um papel nas enxaquecas. Ela transmite sinais entre os nervos e também dilata os vasos sanguíneos.

Ao longo dos anos, os pesquisadores continuaram a reunir evidências disso. "As informações vieram a conta-gotas ao longo do tempo", disse o Sean E. Harper, vice-presidente executivo de pesquisa e desenvolvimento da Amgen.

Eventualmente, um panorama mais completo surgiu: as pessoas que têm enxaquecas parecem produzir bastante CGRP.

Quando os investigadores infundiram o CGRP em pessoas propensas a enxaquecas, elas tiveram dores de cabeça. Quando deram a molécula a pessoas que não sofrem desse mal, a substância foi inócua. Essa foi uma descoberta crucial, disse o Robert Conley, pioneiro no desenvolvimento de terapias para enxaqueca na Lilly. Isso significa que bloquear alguns (não todos) CGRPs pode evitar dores de cabeça sem interferir em suas funções normais no corpo.

As empresas começaram a desenvolver pequenas moléculas para bloquear o CGRP, mas elas se mostraram muito tóxicas para serem usadas como medicamentos. Então, os pesquisadores se voltaram para os anticorpos, que funcionam de maneira diferente. Aimovig, o fármaco recém-aprovado, bloqueia a molécula na superfície celular à qual o CGRP deve se unir para gerar seu efeito biológico.

Os anticorpos persistem no corpo, observou o Harper, e é por isso que os pacientes podem ser tratados apenas uma vez por mês. (Diferentemente de outras empresas, a Alder está desenvolvendo um medicamento para ser infundido por via intravenosa em um consultório médico a cada três meses).

Laura Greer, 38, pediatra em Etna, New Hampshire, tem cerca de oito dias de enxaqueca por mês, apesar de usar oito tratamentos distintos, incluindo um dispositivo que transmite um pulso magnético à sua cabeça. Sem eles, seus dias mensais de enxaqueca eram cerca de 14.

Ela tentou mais de 40 tratamentos ao longo de anos para encontrar apenas alguns que ajudam, e apenas parcialmente, e que causam efeitos colaterais como boca seca e esquecimento de palavras.

"Estou tão esperançosa com esse novo medicamento", disse Greer, que é um paciente de Tepper. Mas ela se preocupa com o preço e se sua seguradora vai custear o tratamento.

Robin Overlock, 32, participou de um ensaio clínico do inibidor de CGRP da Teva. Ela estava com 27 dias de enxaqueca por mês, com episódios que podiam durar cinco dias.

Ela não sabia se estava tomando o remédio ou um placebo, mas, uma vez que começou a receber injeções, sentiu que tinha muito menos dias de enxaqueca. Quando o estudo terminou, ela e os todos os demais participantes passaram a receber a droga propriamente dita. Sua última injeção foi em janeiro.

Desde então, ela teve apenas duas dores de cabeça — e tão leves que nem precisou de medicação. Apenas um evento foi longo —5h. "É definitivamente uma mudança de vida", diz Overlock.

ENTENDA A DOENÇA

O que é enxaqueca?

É uma doença de causa hereditária que provoca crises de dor de cabeça de intensidade moderada a forte

Quais são os sintomas?

A dor tem caráter pulsátil, atinge um dos lados da cabeça e é agravada por atividades físicas rotineiras. Pode ser acompanhada de náusea, vômito, intolerância à luz e ao barulho. Em alguns casos, é antecedida por alterações no campo visual e por formigamento na face ou nos membros superiores

O que causa o problema?

Um desequilíbrio bioquímico de origem hereditária que leva à inflamação de vasos sanguíneos das meninges e do couro cabeludo. Nas pessoas predispostas, as crises podem ser desencadeadas por fatores hormonais, alimentares, emocionais ou climáticos, entre outros

Quando a doença se torna crônica?

Quando as crises ocorrem em no mínimo 15 dias por mês por no mínimo três meses

Qual o tratamento hoje?

O tratamento da crise é feito com analgésicos comuns e medicamentos específicos para enxaqueca, além de anti-inflamatórios. Quando as crises são muito frequentes, pode ser feito tratamento preventivo com drogas de uso continuado

NAS ARTES

O poeta João Cabral de Melo Neto (1920-1999), que sofria de enxaqueca, escreveu sobre o tema em 1966:

Num monumento à aspirina

Claramente: o mais prático dos sóis, o sol de um comprimido de aspirina: de emprego fácil, portátil e barato, compacto de sol na lápide sucinta. Principalmente porque, sol artificial, que nada limita a funcionar de dia, que a noite não expulsa, cada noite, sol imune às leis de meteorologia, a toda hora em que se necessita dele levanta e vem (sempre num claro dia): acende, para secar a aniagem da alma, quará-la, em linhos de um meio-dia.

Convergem: a aparência e os efeitos da lente do comprimido de aspirina: o acabamento esmerado desse cristal, polido a esmeril e repolido a lima, prefigura o clima onde ele faz viver e o cartesiano de tudo nesse clima. De outro lado, porque lente interna, de uso interno, por detrás da retina, não serve exclusivamente para o olho a lente, ou o comprimido de aspirina: ela reenfoca, para o corpo inteiro, o borroso de ao redor, e o reafina. 

 

Departamento de Comunicação CRF-SP

(Fonte: Folha de S.Paulo)

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