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Revista do Farmacêutico

PUBLICAÇÃO DO CONSELHO REGIONAL DE FARMÁCIA DO ESTADO DE SÃO PAULO
Nº 126 - MAI - JUN - JUL / 2016

COMISSÕES ASSESSORAS / PESQUISA CLÍNICA

   

Por que (ainda) não confiar na fosfoetanolamina

Discussão sobre a substância mostra a importância da pesquisa clínica para segurança e bem-estar da população e eficácia dos medicamentos

 

pesquisa-clinica01Todos os medicamentos necessitam de estudos baseados em aprovações éticas e técnicas antes da aprovação

Toda a comoção causada pelo caso fosfoetanolamina evidencia a carência que o mercado apresenta de novas moléculas para tratamento de doenças, principalmente, na oncologia. No entanto, para que uma nova substância seja considerada um medicamento, são necessárias diversas etapas que dispendem anos de pesquisa científica e clínica, além de financiamento público ou privado. 

A partir de um indício terapêutico, diversas etapas laboratoriais são realizadas com uma molécula promissora, tais como sua purificação, definição e análise de estrutura, permitindo uma avaliação primária do seu comportamento toxicológico e farmacológico.  A partir dessas informações, se iniciam os estudos pré-clínicos, não realizados em humanos e conduzidos laboratorialmente por meio de testes in vitro e em animais. 

Durante esse período, são coletadas informações sobre a possível atuação da molécula candidata ao novo medicamento e seu respectivo alvo terapêutico. “Essa fase é de extrema importância para avaliação da possível toxicidade da molécula, estimativas de dose, entendimentos de farmacocinética e farmacodinâmica”, afirma a dra. Raquel de Campos Gomes da Silva, vice-coordenadora da Comissão Assessora de Pesquisa Clínica do CRF-SP.

FASE CLÍNICA

É durante a fase clínica do desenvolvimento de um medicamento que serão realizados testes em diversos grupos de seres humanos para avaliar, principalmente, a tolerabilidade, a segurança, a farmacocinética e a eficácia da molécula. Esse tipo de estudo geralmente é separado em quatro fases: 

Fase 1: é realizada com um grupo pequeno de voluntários, que recebe doses crescentes do medicamento para avaliação de tolerabilidade, afim de determinar a dosagem que deve ser ministrada em humanos. Em oncologia, os estudos desta fase são realizados com pacientes cujas possibilidades de tratamento convencional foram esgotadas. 

Fase 2: é geralmente realizada em pessoas que já apresentam a doença para qual a molécula está sendo estudada. Nesta etapa, informações de indicação da eficácia, relação dose-resposta, confirmação da segurança, biodisponibilidade e bioequivalência em diversas formulações são analisadas. 

Fase 3 (mega trials): compara-se tratamentos padrões com o novo tratamento proposto para avaliar a eficácia. É realizado um estudo terapêutico ampliado para verificar o resultado e o risco-benefício a curto e longo prazos, além de verificar o perfil das reações adversas mais frequentes e características especiais do medicamento. Ao final desta fase, caso o produto investigacional tenha apresentado resultados satisfatórios, é solicitado o registro do medicamento no país à autoridade sanitária. 

Fase 4 (farmacovigilância): é realizada após a concessão do registro e comercialização do medicamento. Por meio dela, se obtém dados da exposição do medicamento a milhares de pessoas e interações com outros medicamentos. Este acompanhamento irá fornecer detalhes adicionais sobre a segurança do produto, detectando e definindo efeitos colaterais previamente desconhecidos ou incompletamente qualificados, assim como os fatores de risco relacionados. 

“É importante salientar que para todos os estudos com animais e seres humanos são necessárias aprovações éticas e técnicas. Caso durante o decorrer de alguma das fases sejam detectadas informações que questionam a segurança do produto investigado, a pesquisa deve ser suspensa”, ressaltou a dra. Raquel de Campos Gomes da Silva, vice-coordenadora da Comissão Assessora de Pesquisa Clínica do CRF-SP.

A farmacêutica conta que diferentes modelos de estudos podem ser adaptados para diferentes necessidades, exemplo disso é que estudos para tratamento de câncer nem sempre são realizados em pacientes saudáveis. 

FOSFOETANOLAMINA

A fosfoetanolamina não possuía estudos clínicos de fases 1, 2 e 3 antes de ter sua manipulação, distribuição e prescrição. Isto é, muitas etapas importantes e cruciais de uma pesquisa foram suprimidas antes do seu uso clínico, fases que agora estão em vigência e seus primeiros resultados ainda estão sob análise, ressaltou a dra. Raquel Gomes da Silva.

O Núcleo de Pesquisa e Desenvolvimento de Medicamentos da Universidade Federal do Ceará (NPDM-UFC) pretende iniciar em breve a primeira fase da pesquisa clínica com a fosfoetanolamina. Nela, quatro diferentes dosagens do composto serão dadas por via oral a um grupo de 60 a 120 voluntários sadios, sem câncer, para checar a sua toxicidade. Se aprovado nesse ensaio inicial, o composto avança para os estudos clínicos da segunda fase no Instituto Nacional de Câncer (Inca), do Rio de Janeiro. 

Os testes no NPDM-UFC e no Inca fazem parte do conjunto de estudos pré-clínicos e clínicos que estão sendo conduzidos por um grupo de trabalho criado em outubro do ano passado pelos ministérios da Saúde e da Ciência, Tecnologia e Inovação para estudar a fosfoetanolamina. 

No dia 13 de abril de 2016, o Congresso Nacional aprovou a lei nº 13.269, que autoriza o uso da fosfoetanolamina sintética por pacientes diagnosticados com neoplasia maligna, mesmo antes de ser registrada e regulamentada pela Anvisa.

“Sabemos que é moroso o desenvolvimento de um medicamento e que há carência de tratamentos para determinadas doenças, mas não podemos fechar os olhos para o conhecimento, ao menos das informações básicas, antes de disponibilizar ao uso da população, visto que todo o processo de pesquisa visa a segurança e o bem-estar, além da eficácia dos novos medicamentos”, conclui a dra. Raquel. 

Por Mônica Neri

 

  

  

 

     

     

    farmacêutico especialista
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