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Revista do Farmacêutico

PUBLICAÇÃO DO CONSELHO REGIONAL DE FARMÁCIA DO ESTADO DE SÃO PAULO
Nº 125 - MAR - ABR / 2016

ORIENTAÇÃO JURÍDICA

  

 

Assistência farmacêutica nas prisões

Sistema Penitenciário do Estado de São Paulo, que detém a maior população carcerária do país, é composta, atualmente, por 164 unidades

 

A evolução da vida em sociedade trouxe cada vez mais complexidade às relações entre as pessoas. O Estado Moderno brasileiro, no esteio das lutas históricas pela garantia de direitos individuais, no intuito conjunto de manter a ordem e segurança aos cidadãos, depara-se com a problemática que segue a mesma taxa de progressão, qual seja: o aumento vertiginoso da população carcerária.

Consoante dados do Conselho Nacional de Justiça¹, a população carcerária brasileira é de 711.463 presos. Segundo o Ministério da Justiça, tal montante mantém o Brasil em 4º lugar no ranking mundial² e, nesse panorama, São Paulo apresenta índice de 497 presos a cada 100 mil habitantes³. Ao seu turno, o Sistema Penitenciário do Estado de São Paulo, que detém a maior população carcerária do país, é composta, atualmente, por 164 unidades⁴. Por consequência, o elevado número de detentos, aliado à falta de infraestrutura para manutenção de condições mínimas de sobrevivência, denota graves problemas que acometem o sistema carcerário, comprometendo a segurança pública e a confiabilidade dos cidadãos na figura do Estado como ente capaz de produzir a ordem e estabilidade sociais.

É nessa conjuntura que inserimos a discussão acerca da importância de prestação de assistência farmacêutica aos detentos. Nos termos do que prevê a Constituição Federal (artigo 1º, “caput”, inciso III), é fundamento da República Federativa do Brasil a dignidade da pessoa humana. Nesse sentido, o Ilustre Professor José Afonso da Silva ensina que: “A Constituição de 1988 abre as perspectivas de realização social profunda pela prática dos direitos sociais que ela inscreve e pelo exercício dos instrumentos que oferece à cidadania e que possibilita concretizar as exigências de um Estado de justiça social, fundado na dignidade da pessoa humana”⁵  

População carcerária no Brasil é de 711.463 presos. Em São Paulo, a cada 100 mil habitantes, 497 estão presosPopulação carcerária no Brasil é de 711.463 presos. Em São Paulo, a cada 100 mil habitantes, 497 estão presosCom o propósito de garantir a materialização da dignidade da pessoa humana no ambiente carcerário, urge destacar que a assistência farmacêutica a presenta papel primordial, haja vista que o farmacêutico é incumbido de conferir todas as prescrições médicas, manter um controle rigoroso do armazenamento e validade de todos os itens, acompanhar, orientar e monitorar a correta separação e manipulação dos medicamentos, supervisionar a dispensação de itens que necessitam de um controle especial (medicamentos termolábeis, psicotrópicos e entorpecentes, injetáveis multidose, dentre outros), conferir e validar todo o processo antes da dispensação ao paciente. 

É inegável que o medicamento bem utilizado é o recurso terapêutico de maior custo-efetividade, mas o uso inapropriado constitui um problema de saúde pública mundial. O profissional farmacêutico age, portanto, imbuído de valores éticos, comportamentos, habilidades, compromissos e corresponsabilidades na prevenção de doenças, promoção e recuperação da saúde, de forma integrada à equipe de saúde. É, pois, essencial em ambiente tão hostil como de uma prisão, onde são patentes a falta de salubridade (excesso de umidade, má alimentação, iluminação inadequada), superlotação, precariedade na alimentação e consumo de drogas⁶.  

Em completa dissonância do objetivo constitucional supramencionado atribuído à Administração Pública, bem como em detrimento das questões de segurança e saúde públicas descritas, o Estado de São Paulo propôs Ação Judicial (Processo nº 0011584-87.2014.4.03.6100), contra o Conselho Regional de Farmácia do Estado de São Paulo, em trâmite perante a 4ª Vara Cível Federal da Subseção Judiciária de São Paulo, na qual requereu: “a procedência integral da presente, para que seja declarada a inexistência de obrigatoriedade de farmacêutico nos estabelecimentos penitenciários do Estado e em todos os órgãos públicos análogos (...),”. 

Todavia, no exercício adequado, ponderado e firme que se espera dos órgãos do Poder Judiciário, provocado pela defesa combativa do CRF-SP, o Meritíssimo Magistrado atuante proferiu sentença por meio da qual julgou o pedido totalmente improcedente, reconhecendo a necessidade de presença do farmacêutico e mantendo incólume os autos de infração lavrados pelo CRF-SP, acrescentando que: “com o advento da Lei n.º 13.021, de 08 de agosto de 2.014, necessário se faz a presença de farmacêutico durante todo o horário de funcionamento, da farmácia (...)”.     

Além da citada Lei nº 13.021/2014, podemos salientar que há diversos outros diplomas legais correlatos que indicam a necessidade e obrigação de manutenção do profissional farmacêutico, tais como a Lei nº 8.080/90, em seu artigo 6º (Art. 6º Estão incluídas ainda no campo de atuação do Sistema Único de Saúde (SUS): / I - A execução de ações: (...) / d) de assistência terapêutica integral, inclusive farmacêutica;) e o artigo 14, da Lei nº 7.210/84 (Lei de Execução Penal), que  salvaguarda o atendimento farmacêutico no âmbito carcerário (Art. 14. A assistência à saúde do preso e do internado de caráter preventivo e curativo, compreenderá atendimento médico, FARMACÊUTICO e odontológico).

Vislumbra-se que a grave situação que permeia os presídios no Brasil não é recente, contudo o agravamento do quadro exige dos governantes respostas mais céleres e eficazes. O cumprimento da função primordial da pena, consiste na ressocialização do encarcerado, perpassa pela observância obrigatória dos direitos e garantias fundamentais desta população. Obter, assim, orientação e acompanhamento fármaco-terapêuticos é condição “sine qua non” ao desenvolvimento saudável do indivíduo recluso.  

 

Samuel Henrique Delapria - Departamento jurídico do CRF-SP

Por Samuel Henrique Delapria

Departamento jurídico do CRF-SP

 

1 http://www.cnj.jus.br/images/imprensa/diagnostico_de_pessoas_presas_correcao.pdf - Acesso: 11.05.2016.

2 http://noticias.uol.com.br/cotidiano/ultimas-noticias/2015/06/23/prisoes-aumentam-e-brasil-tem-4-maior-populacao-carceraria-do-mundo.htm - Acesso: 11.05.2016.

3 http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2015/06/1646639-com-607-mil-presos-brasil-tem-a-4-maior-populacao-carceraria-do-mundo.shtml - Acesso: 11.05.2016.

4 http://www.sap.sp.gov.br/ - Estrutura da Secretaria de Administração Penitenciárias, visto em 18/03/2016.

5 SILVA, José Afonso. Curso de direito Constitucional Positivo. 11. ed. Malheiros. [S.l], [19--]. p. 121 e 277.

6  http://www.bbc.com/portuguese/noticias/2014/01/140115_seis_prisoes_lk - Acesso: 11.05.2016.

 

 

 

 

     

     

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