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Revista do Farmacêutico

PUBLICAÇÃO DO CONSELHO REGIONAL DE FARMÁCIA DO ESTADO DE SÃO PAULO
Nº 121 - ABR-MAI / 2015 

 

Palavra do Ministrante - ATENÇÃO FARMACÊUTICA

Atuação do farmacêutico na gerontologia

 

Brasil experimenta, desde 1950, um franco processo de transição demográfica devido à redução nos níveis de fecundidade e mortalidade que juntos contribuíram para o aumento da parcela de idosos de 4,3%, em 1950, para 10,8% em 2010 (VASCONCELOS; GOMES, 2012). Ainda, estima-se que em 2050 os idosos representem 29,8% da população brasileira (IBGE, 2008).
Esse grupo usa em média três vezes mais medicamentos para o tratamento de doenças crônicas em relação a indivíduos mais jovens (VINKS et al., 2006), fato que, aliado às alterações fisiológicas decorrentes do envelhecimento, predispõe essa parcela da população a um risco aumentado de aparecimento de problemas relacionados aos medicamentos (PRM), em especial, reações adversas (BOURGEOIS et al., 2010).
Estudos brasileiros que identificam a prevalência ou a incidência de PRM nos idosos são escassos. Correr et al. (2007) avaliaram as prescrições de 76 pacientes idosos residentes de uma instituição geriátrica no município de Apucarana, PR; um paciente possuía 1 medicamento prescrito em sobredose, outro apresentava prescrição com duplicidade terapêutica, e 38 estavam sujeitos a no mínimo 1 interação medicamentosa; além disso, 13,5% (31/230) dos medicamentos prescritos foram considerados inapropriados.
Nesse contexto, idosos representam o estrato populacional que mais se beneficiaria com a prevenção, detecção e controle de PRM, isto é, com a prática da Atenção Farmacêutica. No âmbito gerontológico, a Atenção Farmacêutica deve ser norteada pela Política Nacional de Saúde da Pessoa Idosa. Segundo ela, o cuidado ao idoso exige uma abordagem global, interdisciplinar e multidimensional, e tem a finalidade de promover sua autonomia, independência e autocuidado (BRASIL, 2006b).
Para tanto, a capacidade funcional deve ser avaliada, o que geralmente é feito por meio da Avaliação Global Ampla (AGA, Comprehensive Geriatric Assessment). Esta junta tanto métodos clássicos não padronizados como métodos estruturados de avaliação do estado de saúde. Os métodos estruturados permitem a aferição funcional por meio de escalas e são representados por testes de desempenho (observação direta) e questionários (auto aplicados ou aplicados pelo clínico).
O Ministério da Saúde recomenda o uso de três questionários de avaliação funcional do idoso (BRASIL, 2006a): The Functional Independence Measure (FIM) (HAMILTON; GRANGER, 1987), The Index of Independence in Activities of Daily Living (IADL) (KATZ et al., 1963) e The Physical Self-Maintenance Scale (PSMS) (LAWTON; BRODY, 1969). Assim, o farmacêutico clínico gerontólogo deve ser capaz de prestar Atenção Farmacêutica considerando necessariamente os aspectos funcionais do idoso.
Uma estratégia simples e efetiva para prevenir a ocorrência de PRM em idosos é evitar a prescrição e o uso de medicamentos potencialmente inapropriados (MPI). Esses representam medicamentos cujos riscos do uso por idosos se sobrepõem aos benefícios, e ainda possuem alternativas terapêuticas mais seguras e igualmente efetivas (AGS, 2012).
O método explícito para identificação de MPI mais usado hoje em dia é o Critério de Beers, cuja última atualização data de 2012. Esse critério permite avaliar a qualidade da prescrição médica já que o uso de MPI tem sido associado a desfechos negativos em saúde. Como exemplo, uma recente meta-análise concluiu que idosos que utilizam MPI apresentam maior risco de morte (Risco Relativo = 1,11, Intervalo de Confiança de 95% = 1,01 - 1,22, p = 0,023) independentemente de comorbidades, da existência de polifarmácia ou do tipo de MPI (SICHIERI et al., 2013). Em São Paulo, SP, Cassoni et al. (2014) mostraram que 30,2% dos idosos usam no mínimo 1 MPI.
A atuação clínica do farmacêutico em gerontologia é justificada pelo alto risco que idosos possuem em apresentar PRM. Ele deve avaliar aspectos funcionais do idoso e identificar o uso MPI, os quais são causas frequentes de reações adversas.
A alta demanda de serviços farmacêuticos no âmbito gerontológico se contrapõe à ausência de profissionais qualificados a prestar cuidado especializado ao idoso. Até a presente data, por exemplo, há no Brasil somente um farmacêutico gerontólogo titulado pela Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia (LISTA, 2015). Logo, a capacitação do farmacêutico é o primeiro desafio a ser enfrentado no caminho à promoção do uso racional de medicamentos na população idosa.

 

 

ThiagoDidoneDR. THIAGO DIDONE é farmacêutico-bioquímico pela USP, especialista em gerontologia pelo Instituto Paulista de Geriatria e Gerontologia, e mestre em Atenção Farmacêutica também pela USP. Atualmente é farmacêutico clínico da UBS Carlos Muniz e professor de pós-graduação do Centro Universitário São Camilo e da UNINOVE. 

O dr. Thiago irá ministrar o curso Avanços na Atuação do Farmacêutico na Gerontologia no XVIII Congresso Farmacêutico de São Paulo

 

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
AMERICAN GERIATRICS SOCIETY (AGS). American Geriatrics Society updated Beers Criteria for potentially inappropriate medication use in older adults. J Am Geriatr Soc, v. 60, n. 4, 616-631, 2012.
BOURGEOIS, F. T. et al. Adverse drug events in the outpatient setting: an 11-year national analysis. Pharmacoepidemiol Drug Saf, v. 19, n. 9, 901-910, 2010.
BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Envelhecimento e saúde da pessoa idosa. Cadernos de Atenção Básica - n.º 19: Série A. Normas e Manuais Técnicos. Brasília: Ministério da Saúde, 2006a.
______. Ministério de Estado da Saúde. Portaria nº 2.528, de 19 de outubro de 2006. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 20 out. 2006b.
CASSONI, T. C. J. et al. Uso de medicamentos potencialmente inapropriados por idosos do Município de São Paulo, Brasil: Estudo SABE. Cad Saude Pública, v. 30, n. 8, 1708-1720, 2014.
CORRER, C. J. et al. Riscos de problemas relacionados com medicamentos em pacientes de uma instituição geriátrica. Rev Bras Cienc Farm, v. 43, n. 1, 2007.
HAMILTON, B. B.; GRANGER, C. A uniform national data system for medical rehabilitation. In: Uhrer MJ, editor. Rehabilitation outcomes: analysis and measurement. Baltimore: Paul H. Brookes; 1987. p. 137-47.
INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA (IBGE). Projeção da população do Brasil por sexo e idade 1980-2050, Revisão 2008. Rio de Janeiro: IBGE, 2008.
KATZ, S. et al. Studies of illness in the aged. The index of ADL: a standardized measure of biological and psychosocial function. JAMA, v. 185, 914-919, 1963.
LAWTON, M. P.; BRODY, E. M. Assessment of older people: self-maintaining and instrumental activities of daily living. Gerontologist, v. 9, 179-186, 1969.
LISTA de titulados. In: SOCIEDADE BRASILEIRA DE GERIATRIA E GERONTOLOGIA [site]. Disponível em: <http://sbgg.org.br/sbgg/lista-de-titulados/>. Acesso em: 30 mar. 2015.
SICHIERI, K. et al. Mortality Associated with the Use of Inappropriate Drugs According Beers Criteria: a Systematic Review. Adv Pharmacol Pharm, v. 1, n. 2, 74-84, 2013.
VASCONCELOS, A. M. N.; GOMES, M. M. F. Transição demográfica: a experiência brasileira. Epidemiol Serv Saúde, v. 21, n. 4, 539-548, 2012.
VINKS, T. H. et al. Identification of potential drug-related problems in the elderly: the role of the community pharmacist. Pharm World Sci, v. 28, n. 1, 33-38, 2006.

 

 

  

 

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